5 de dezembro de 2007

Olá



Mesmo que este meu Natal seja um bocadinho diferente por motivos familiares irreversíveis, vou-me desdobrar em esforços para que mantenha uma das tradições de família: “fazer bem sem olhar a quem”.
Não que o faça apenas nesta data. Ocupo algum dos meus tempos livres em voluntariado e em defesa de causas que merecem tudo por um sorriso.

Por outro lado, desde a trágica situação acontecida a Miklos Fehér, que presenciei ao vivo, o mundo em meu redor abriu-me os olhos para outras realidades que precisam de atenção todos os dias. E parecendo que não, as crianças estarão sempre em primeiro lugar. Daí, recuperar um texto que o meu Avô escreveu em Dezembro de 2003 para tentar ilustrar aquilo que quero dizer.

"A minha árvore de Natal este ano não tem cor!
Foi feita, apenas e só, para os meninos da rua que eu conheço.

Colocada a um canto do meu mundo, não tem presentes e, no lugar das bolinhas de fantasia, são visíveis amargas recordações duma vida constantemente injustiçada. Fruto duma visão de dor e sofrimento, de abandono e de tristeza, que abrange todos aqueles que sofrem na pele o dia-a-dia que vivemos.
É Natal, dizem-me. Eu sei muito bem que é Natal! Aliás, todos nós sabemos. E para os meninos da rua que eu conheço, a comprová-lo estão as milhares de mensagens de amor e carinho hipócritas que ouvimos todos estes dias que se aproximam desta quadra. Se não chegasse, bastaria olhar os milhões de calendários coloridos que aceleram os anos e reconhecer nos jardins deste país os presépios feitos de fantasias que não brilham e apenas estão por ali.

Mas para quem está habituado a sofrer os dias pardos da desventura e da desgraça, da fome e da solidão, do esquecimento a que são votados nas horas sempre iguais, é apenas mais um ciclo de vinte e quatro horas que custam a passar. É apenas o olhar para um amanhã sem soluções. As realidades deste espelho retardado que se consegue vislumbrar em dor e sofrimento de quem nunca conseguiu alcançar o que deseja e a que tem direito. É neste meu mundo que vivem os meninos da rua que eu conheço.

Nestes meninos da rua que eu conheço, há em cada história pessoal uma tragédia que se esconde. Há em cada silêncio consentido, uma revolta amarga e negra que não se consegue perceber. Existe em cada rosto imberbe de criança, uma expressão azeda e ferida de ilusões e de tormentos. De sonhos perdidos e desfeitos. De rugas que escondem as horas, os dias, os anos, a que conseguem sobreviver.

São estes os meninos da rua que eu conheço, alguns já crescidos, que melhor entendem o destino ao qual estão vinculados e a que é impossível fugir. Por cada um dos seus olhares, vagos e perdidos, destes meninos da rua que eu conheço, perfila o lado triste de quem morre de frio a cada esquina. Cada um deles apenas a mostrar o futuro incerto que se conta e se transmite. Feito de nostalgia e fé. Por vezes, recheados de sonhos desfeitos para um dia que eles sabem não ter amanhã. Um dia ténue e vazio como a própria quadra que festejamos.

Daí que, na minha árvore de Natal deste ano, apenas haja espaço para os que se encontram isolados e tristes. Para os que da fome e da escassez fazem a fartura de nada possuírem. Para aqueles a quem mais um pouco de carinho e de atenção bastaria para esquecer toda uma vida sem sentido.
Por isso, não façam do meu silêncio uma obrigação de cobardia. Por isso, não me obriguem a mudar a cor à minha árvore de Natal. E se por milagre ou ilusão, arte mágica ou fantasia, as cores se alterem ou apareçam, ao menos que seja para os meninos da rua que eu conheço."


Agora vou fazer a Árvore de Natal da minha Avó.

5 comentários:

Anónimo disse...

Olá, minha querida.
Passei para te desejar dentro do possível um bom Natal.
Tentei comentar o blogue do teu Avô, mas não consegui.

Comovente o texto...

"A minha árvore de Natal este ano não tem cor!
Foi feita, apenas e só, para os meninos da rua que eu conheço. "

Infelizmente o Natal sabemos que é assim e, que apesar do muito que já se faz, é muito pouco, muito pouco mesmo!!

Um abraço carinhoso, para ti e teu Avô Eduardo.

(não consigo comentar com o registo...)

Anónimo disse...

Minha cara Tita. Muito ausente aqui retorno deparando com algumas situações que desconhecia...mas, a alma tua, continua a ser cada vez mais ampla...não sei qual o blog que mais utilizas, mas aqui deixo uma mensagem de um bom Natal e um ano novo formidável...
Abraço grande
Morfeu

Jorge Castro (OrCa) disse...

Já por cá passei algumas vezes, lendo e relendo este teu olá ao Natal... Direi, afinal, dele o que disse ao avô Eduardo e que já terás visto, com certeza.

Entretanto, por entre os altos e baixos que a vida leva e traz, deixa-me evocar Dezembro de há quatro anos, quando uma estrela acendeu de luz Sete Mares... E continua teimosamente acesa essa luz. Nem imaginarás, talvez, por quantos céus essa luz já se espalhou!

Um leve bater de asas da mariposa, que a rotação da Terra amplia, até à desmesura de um tufão. É assim a vida e os nossos actos nela.

Votos de um 2008 pleno das mais felizes realizações.

Menina Marota disse...

Boa tarde. Vinha actualizar a minha leitura e acabei a reler o teu texto...
Que a Estrela que vela por ti, lá no Céu, ajude a amenizar a dor do vosso coração.

Um grande abraço e que 2008 valha a pena .

António Miguel Miranda disse...

Divulgação

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António Miguel Brochado de Miranda
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Tema: Haverá uma fronteira entre os Aparafusados e os Desaparafusados?" Outra maneira de falar sobre o Ensino Especial.

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