17 de março de 2005



Ficção ou… talvez não *

"Estamos no ano de 2070, acabo de completar os 50, mas a minha aparência é de alguém de 85. Tenho sérios problemas renais porque bebo muito pouca água. Creio que me resta pouco tempo. Hoje sou uma das pessoas mais idosas nesta sociedade. Recordo quando tinha 5 anos. Tudo era muito diferente. Havia muitas árvores nos parques, as casas tinham bonitos jardins e eu podia desfrutar de um banho de chuveiro com cerca de uma hora.

Agora usamos toalhas em azeite mineral para limpar a pele. Antes todas as mulheres mostravam a sua formosa cabeleira. Agora devemos rapar a cabeça para a manter limpa sem água. Antes o meu pai lavava o carro com a água que saía de uma mangueira. Hoje os meninos não acreditam que a água se utilizava dessa forma.
Recordo que havia muitos anúncios que diziam CUIDA DA ÁGUA, só que ninguém lhes ligava; pensávamos que a água jamais se podia terminar. Agora, todos os rios, barragens, lagoas e mantos aquíferos estão irreversivelmente contaminados ou esgotados.

Antes a quantidade de água indicada como ideal para beber era oito copos por dia por pessoa adulta. Hoje só posso beber meio copo. A roupa é descartável, o que aumenta grandemente a quantidade de lixo; tivemos que voltar a usar os poços sépticos (fossas) como no século passado porque as redes de esgotos não se usam por falta de água.

A aparência da população é horrorosa; corpos desfalecidos, enrugados pela desidratação, cheios de chagas na pele pelos raios ultravioletas que já não têm a capa de ozono que os filtrava na atmosfera. Imensos desertos constituem a paisagem que nos rodeia por todos os lados.
As infecções gastrointestinais, enfermidades da pele e das vias urinárias são as principais causas de morte. A indústria está paralisada e o desemprego é dramático. As fábricas dessalinizadoras são a principal fonte de emprego e pagam-te com água potável em vez de salário. Os assaltos por um bidão de água são comuns nas ruas desertas. A comida é 80% sintética. Pela ressiquidade da pele uma jovem de 20 anos está como se tivesse 40.

Os cientistas investigam, mas não há solução possível. Não se pode fabricar água. O oxigénio também está degradado por falta de árvores, o que diminuiu o coeficiente intelectual das novas gerações. Alterou-se a morfologia dos espermatozóides de muitos indivíduos. Como consequência há muitos meninos com insuficiências, mutações e deformações. O governo até nos cobra pelo ar que respiramos: 137 m3/ dia por habitante e adulto.

A gente que não pode pagar é retirada das "zonas ventiladas" que estão dotadas de gigantescos pulmões mecânicos que funcionam com energia solar. Não são de boa qualidade, mas pode-se respirar. A idade média é de 35 anos. Em alguns países ficaram manchas de vegetação com o seu respectivo rio que é fortemente vigiado pelo exército. A água tornou-se um tesouro muito cobiçado mais do que o ouro ou os diamantes. Aqui em volta, não há arvores porque quase nunca chove, e quando chega a registar-se precipitação, é de chuva ácida; as estações do ano têm sido severamente transformadas pelas experiências atómicas e da indústria contaminante do século XX.

Advertia-se que havia que cuidar o meio ambiente e ninguém fez caso. Quando a minha filha me pede que lhe fale de quando era jovem descrevo o bonito que eram os bosques, falo-lhe da chuva, das flores, do agradável que era tomar banho e poder pescar nos rios e barragens, beber toda a água que quisesse, o saudável que era a gente. Ela pergunta-me:
- Mamã! Porque se acabou a água?
Então, sinto um nó na garganta; não posso deixar de sentir-me culpada, porque pertenço à geração que terminou destruindo o meio ambiente ou simplesmente não tomámos em conta tantos avisos.

Agora os nossos filhos pagam um preço alto, e sinceramente creio que a vida na terra já não será possível dentro de muito pouco porque a destruição do meio ambiente chegou a um ponto irreversível. Como gostaria de voltar atrás e fazer com que toda a humanidade compreendesse isto quando ainda podíamos fazer algo para salvar o nosso planeta terra!"

* Núcleo Duro da Escola Secundária Manuel Cargaleiro
(Mónica - 10.º, Ricardo - 11.º, Xana - 12.º,Roberto e Thita - 8.º)

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